Fé Verdadeira (Cícero)

A data é quinta-feira, 26/01/2017.

Você esta dando uma de suas missas. na igreja de Santo Antônio, no centro de SP.

Com toda a animação você conduz a missa, como de costume, suave e carismaticamente. Seus fiéis, como de costume, assistem a missa entusiasmados. A maioria, como de costume, é composta por jovens adultos. Você, como de costume, esta vestindo suas túnicas brancas enquanto anda pela igreja e fala com os fiéis. Sua bíblia, como de costume, esta posicionada no altar, pois já sabe as passagens de cor e não precisa carrega-la. O padre Antonio esta sentado no ultimo banco, assistindo sua missa, como não era de costume.

Ao terminar a missa e falar brevemente com alguns fiéis,o padre Antonio de aproxima.

Padre Antônio: "Cícero, precisamos conversar. Sozinhos."

Minha missa segue nos moldes de sempre, já havia aprendido a ocultar qualquer inquietação durante esses momentos. Mas, sempre que cruzava o olhar com o padre Antônio quase esquecia as falas que já estavam memorizadas há muito tempo.
Assim que o convite é proferido, respondo:
- Aconteceu alguma coisa, Antônio? - Sorrio gentilmente, embora minhas mãos estivessem suando pela tensão.

De qualquer forma, ofereço minha sala, pedindo que ele me acompanhe. Chegando lá, oferecerei um vinho e uma poltrona para o padre se sentar.

Chegando na sua sala (o Padre Antônio também possui uma sala particular na igreja, mas é um pouco menor que a sua), já sentados, Antônio começa a falar:

- Eu e Albuquerque conversamos esses dias... Ele, como representante do Vaticano aqui em SP, tem algumas... dúvidas em relação às suas prioridade aqui na igreja. Você anda preocupado demais na perda de fiéis para a igreja evangélica, mas o Vaticano e nosso Deus todo poderoso nos garantem que os verdadeiros eleitos e seguidores de Cristo sempre irão procurar a Igreja Católica. Albuquerque entende essa sua preocupação como uma falta de fé... Eu temo que talvez ele queria fazer algo à respeito.

O assunto me deixa extremamente nervoso, minhas mãos suavam e tinha a impressão que minha voz mal poderia sair, mas com grande esforço tento responder:
-Mas, Pa-padre Antônio, é nossa missão espalhar a palavra do Senhor. Tenho certeza que o senhor poderia explicar isso para Albuquerque, há muito nos conhecemos, e minha fé no Senhor sempre foi o fio condutor da minha vida, por favor...

Padre Antonio dá um longo suspiro, e, com uma certa frieza na voz, continua:

- Eu entendo, meu filho. Infelizmente, essa decisão não cabe à mim. Albuquerque tem muito com o que se preocupar, afinal, ele representa o Vaticano em São Paulo! Tenho certeza de que ele sabe o que é melhor para a Igreja. Enfim... ele me disse que vai vir hoje mais tarde falar com você. Vou indo para os meus aposentos.

Padre Antônio se retira e vai para o quarto dele.

Dentro de algumas horas, Albuquerque vai chegar na igreja para conversar com você. Neste meio tempo, você pode tomar alguma atitude.

Já de noite, Albuquerque chega na igreja e bate à sua porta:

- Padre Cícero, podemos conversar?

Ao entrar no seu quarto, ele continua, em tom calmo e sereno:

- Bom... você sabe que eu venho acompanhando o andamento da Igreja católica há algum tempo, aqui em São Paulo. Eu gostaria de entender um pouco melhor, de você, quais os seus planos e o que você entende como prioridade em relação à Igreja. Claro que o Vaticano já possui determinados planos, mas precisamos garantir que nossas visões estejam sempre alinhadas, entende?

A sensação era agonizante, os malditos queriam boicotar minha fé a qualquer custo. Tornar a sagrada igreja um espaço decadente pelos seus anseios mesquinhos. Infelizmente, era apenas um padre, um reles peão nessa organização que há muito foge do seu propósito e, se quisesse ter a mínima chance de servir o senhor em vida, teria que me sujeitar, para, ao menos, tocar uns poucos fiéis com a palavra:
- Não tenho planos, Albuquerque. Apenas planejava divulgar a palavra do senhor, mas se isso vai de encontro com a sua visão, tenho certeza que posso ajustar minhas atitudes. De maneira alguma gostaria de contrariar o Vaticano ou o senhor.

A insatisfação por essas palavras crescia dentro de mim, mas por fora, tentava me manter tranquilo. Fazer o que é possível e dentro do possível, talvez uma existência medíocre que me foi reservada pelo Senhor.

- Eu entendo que você tenta fazer o que acha ser certo, Cícero... Mas ao ver os últimos relatórios do padre Antônio, eu não vejo outra opção a não ser questionar a sua fé! - No instante que ele fala dos relatórios, você compreende tudo. Era o Antônio, sempre foi ele. Como ele é um padre mais velho que você, naturalmente ele é o responsável por relatar diretamente ao Albuquerque. Seria fácil para ele manipular os relatórios e passar uma imagem negativa de você e de seus feitos. - Sinceramente... talvez eu seja forçado à retira-lo do cargo de Padre!

- Albuquerque, talvez se me der acesso a esses relatórios, tenho certeza que posso esclarecer tudo- Passo a mão na cabeça, enxugando o suor então prossigo - Por favor, não tome nenhuma decisão precipitada. Tenho certeza que só há um mal entendido, o Senhor há de trazer tudo as claras.

Ele nitidamente fica um pouco estressado, em contraste com a serenidade que o envolvia, até então.

- Ver os relatórios?? Ainda por cima esta questionando os relatórios de um superior? Francamente... agora eu vejo os motivos das preocupações de Antônio sobre você, talvez um padre tão novo seja um erro, realmente... - Ela dá um longo suspiro, como uma tentativa de se acalmar.

- Albuquerque, me esforcei muito para chegar até aqui, minhas intenções...eu...

Minha voz se esvai, uma vida inteira tendo que engolir injustiças por uma hierarquia rígida, não era simples refutar um superior. Apenas fico cabisbaixo.

Ficou nítido que sua fala não o agradou, contudo, após o longo suspiro, ele consegue se acalmar e continua a conversa com você, tranquilamente:

- Veja bem, meu filho... Não vou tomar nenhuma decisão precipitada, por ora. Contudo, caso você não restabeleça sua fé na igreja católica imediatamente, terei de tomar uma atitude mais severa! Fique com Deus.

Ele se levanta e vai embora da Igreja.

Já são 10 horas da noite. Quer tomar alguma atitude ou vai dormir?

Agradeço Albuquerque e prometo seguir a risca os preceitos. Mas, sabia que pouco adiantaria com aquela raposa velha me perseguindo. Solto um suspiro pesaroso e abro uma garrafa de vinho, vou beber e refletir até que o sono apareça.

Exaurido e sem esperanças, você se põe a beber em sua sala.

Pela primeira vez desde que tornou-se padre, você realmente se vê em uma situação que, aparentemente, sua fé não vai te ajudar. Talvez você tenha se metido em um lugar que, mesmo com as melhores das intenções, os únicos capazes de controlar o destino são os mais fortes e influentes.

Passadas algumas horas e algumas boas taças de vinho, você ainda permanece completamente perplexo com todos os últimos acontecimentos. Ser Padre é a conquista da qual mais se orgulha. Você se recusa a perder isto, não dessa forma, e muito menos para alguém tão manipulador quanto o Padre Antônio. Você não entende muito bem quais seriam as suas motivações, mas sua fé te impede de desistir.

Em meio as longas reflexões, você escuta uma voz:

- Deseja saber a verdade, fiel discípulo de Deus? - A voz parece vir de dentro de sua mente.

Após um leve susto, você olha aos arredores. Não há ninguém. A igreja, como bem sabe, esta vazia, pois já passa das 2 horas da manhã. Além disso, você não reconhece esta voz.

Novamente, a mesma voz aparece na sua mente:

- Deseja retirar o véu que te prende e ilude, fiel discípulo de Deus?

Oh meu Senhor, já estou delirando pela bebida ou será o audacioso satanás tentando me iludir nesse momento de fragilidade? Só Ele pode me guiar nesses momentos. Coloco o copo de vinho sobre a mesa, pego o meu crucifixo, ajoelho no chão e começo a rezar, buscando a serenidade da mente.

A sua reza intensa faz com que você se recomponha.

- Não se preocupe, fiel discípulo de Deus, o que escuta é real. Não é delírio, muito menos um demônio. Caso deseje saber a verdade, preciso que confie em minha palavra... Você e uma antiga companheira correm perigo. Vá até o outro escritório desta igreja e esconda-se. Virá ao teu encontro um grande perigo, contudo, provando-se um verdadeiro Eleito Divino, há de beber do Sangue de Cristo.

Era difícil crer naquilo, mas se havia alguma chance de ser um chamado do Senhor, eu, como seu fiel seguidor deveria ser o primeiro a atender. Digo ainda nervoso:
"Se es o seu desejo, meu Deus, só cabe a mim atendê-lo". Corro para o outro escritório e me escondo da melhor forma que posso.
Espero não estar realmente ficando louco, mas, se isso for verdade, será que poderia eu ser o novo messias dessa era?